Introdução
Transtornos depressivos e de ansiedade são comorbidades comuns em pacientes com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). Estudos como os de Faraone et al. (2021) e Kessler et al. (2006) apontam uma prevalência significativa dessas condições associadas ao TDAH, o que exige atenção clínica e estratégias terapêuticas específicas.
Ansiedade e depressão podem ser consequência do TDAH, e não transtornos isolados
Em muitos casos, os sintomas de tristeza e preocupação excessiva não refletem um episódio depressivo maior ou um transtorno de ansiedade primário, mas sim o impacto funcional e emocional das dificuldades impostas pelo TDAH. Comprometimentos como prazos perdidos, dificuldades acadêmicas ou profissionais, conflitos interpessoais e redução do autocuidado — especialmente privação de sono — são frequentemente subestimados. A desregulação emocional, embora pouco explorada, é um componente central do TDAH que pode amplificar tais sintomas.
Tratamento do TDAH pode reduzir os sintomas comórbidos
As diretrizes da Academia Americana de Pediatria (Wolraich et al., 2019) destacam que, em alguns casos, o tratamento adequado do TDAH pode resolver os sintomas ansiosos ou depressivos associados. Estudos longitudinais (Park et al., 2022; Chang et al., 2016) também indicam que o uso contínuo de medicamentos para TDAH está relacionado à redução do risco de depressão, embora esses dados ainda não sejam conclusivos por não serem baseados em ensaios clínicos randomizados.
Monoterapia com atomoxetina: uma estratégia viável
Em pacientes com TDAH e transtorno de ansiedade comórbido, a atomoxetina pode ser uma alternativa eficaz. Estudos controlados por placebo mostraram melhora significativa tanto dos sintomas de TDAH quanto dos transtornos ansiosos (Adler et al., 2009; Geller et al., 2007), sugerindo que a monoterapia com esse fármaco pode ser apropriada em alguns casos.
Mirtazapina como adjuvante subutilizado
Além de seus efeitos ansiolíticos e antidepressivos, a mirtazapina pode ser benéfica para pacientes com TDAH que apresentem insônia, perda de apetite, disfunção sexual ou comorbidades afetivas. A combinação de estimulante pela manhã e mirtazapina à noite, descrita por Adler et al. (2006), é considerada eficaz por muitos especialistas, embora ainda pouco utilizada na prática clínica.
Bupropiona: quando considerar e quando evitar
A bupropiona pode ser útil para tratar sintomas depressivos, fadiga e até o próprio TDAH. No entanto, deve-se evitar seu uso em pacientes com risco de convulsão, ansiedade grave ou uso concomitante de atomoxetina, devido ao risco de interação medicamentosa significativa (Todor et al., 2016; Ju et al., 2022). As diretrizes do CANMAT (Bond et al., 2012) indicam que a bupropiona pode ser usada isoladamente ou combinada a um antidepressivo e TCC.
ISRS e IRSN: opções seguras e eficazes
Muitos adultos com TDAH fazem uso combinado de estimulantes e inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS) ou de serotonina e noradrenalina (IRSN), sobretudo quando há diagnóstico formal de transtornos ansiosos. Dentre os antidepressivos com menor potencial de inibição enzimática (citocromo P450), destacam-se escitalopram, sertralina e venlafaxina — opções recomendadas nas diretrizes de Bond et al. (2012).
Conclusão
Pacientes com TDAH frequentemente apresentam sintomas de ansiedade e depressão, os quais podem ser consequência direta do transtorno ou indicar comorbidades psiquiátricas. A abordagem terapêutica deve ser individualizada, baseada em evidências e considerar o uso racional de psicofármacos com bom perfil de eficácia e segurança.
📚 Referências
- Faraone SV et al., 2021
- Kessler RC et al., 2006
- Wolraich ML et al., 2019
- Park S et al., 2022
- Chang Z et al., 2016
- Adler LA et al., 2006; 2009
- Geller D et al., 2007
- Bond DJ et al., 2012
- Todor I et al., 2016
- Ju R et al., 2022
- Goldberg JF et al., 2024